REFLEXÃO DA SEMANA - DOM MANOEL JOÃO FRANCISCO - BISPO DIOCESANO
ESPERANÇA
Dom Manoel João Francisco
A Quaresma está se aproximando do fim. No próximo domingo, o Quinto da Quaresma, as leituras, propostas pela liturgia, falam da virtude da esperança.
A primeira leitura, extraída do livro do Profeta Ezequiel, mostra-nos o povo no exílio da Babilônia. A situação é de desespero. Os exilados assemelham-se a mortos, empilhados em túmulos. No Evangelho, escrito pelo evangelista João, Lázaro, amigo de Jesus, está há já quatro dias no sepulcro. Numa e noutra situação a promessa é de vida, de ressurreição. Apesar das aparências, Deus não abandona seu povo à morte. “Mesmo quando tudo parece perdido e sem saída, Deus está lá, transformando o desespero em esperança, a morte em vida” (Dehonianos de Portugual).
“Ó meu povo, vou abrir as vossas sepulturas e conduzir-vos para a terra de Israel; e quando eu abrir as vossas sepulturas e vos fizer sair delas, sabereis que eu sou o Senhor” (Ez 37,12-13).
Em nossos dias, a situação não é diferente. A oração da Salve Rainha acontece todos os dias. Somos, de fato, pobres degredados filhos de Eva, gemendo e chorando num vale de lágrimas. Basta ler os jornais, ver os telejornais e ouvir os noticiários no rádio. Apesar de todo o progresso da ciência que permite transplantes de coração, rejuvenescimento dos tecidos, prolongamento da vida, diminuição da mortalidade infantil, o que mais se vê, são mortes, violências, indiferença diante da fome de milhões de pessoas, festas transformadas em tragédias, passividade diante de perdas de direitos conquistados com muita luta. O povo anda desesperançado. Grande é o clamor e as reclamações, pequena a disposição de organizar-se e lutar. De um lado a satisfação pelos avanços contínuos da ciência e da técnica, de outro, a melancolia e a frustração por ver que o progresso não trouxe a felicidade almejada.
Na Quaresma, Deus nos convida à conversão. Como Jesus que chorou diante do sepulcro do amigo Lázaro, precisamos ser capazes de nos comover e chorar diante da morte e da dor. A dor, no entanto, não pode nos paralisar como fez com Maria, irmã de Lázaro. Entorpecida pela perda do irmão, perde a esperança, e não tem coragem, nem de se levantar e ir ao encontro de Jesus quando ele chegou.
Somente Deus pode fazer um morto voltar à vida. Contudo, ele quer que participemos de sua ação. Não foi Jesus quem tirou a pedra do sepulcro. Outros o fizeram. Depois de ressuscitado, Lázaro continuou atado de mãos e pés com os lençóis mortuários. O rosto dele permaneceu coberto com o sudário. Foram provavelmente um ou dois dos Doze que o libertaram das ataduras.
O oposto da esperança não é o desespero, mas o medo e a acomodação. A pessoa possuída pelo medo vê o futuro como algo perigoso, diante do qual é preciso ter cautela. Para o acomodado o futuro é algo sem valor. Não vale a pena lutar e, no fim constatar que “o sonho do homem se assemelha às ilusões do mar” (Paul-Jean Toulet).
Uma e outra atitude imobilizam a pessoa, incapacitando-a de agir. Por isso, neste quinto domingo da Quaresma somos convidados à esperança, a virtude que não permite acomodação, mas nos faz olhar o futuro como possibilidade e certeza de mudança. Quem espera empenha-se na concretização daquilo que espera. A esperança cristã assemelha-se à esperança do agricultor que não cruza os braços na expectativa que a colheita aconteça. Pelo contrário, justamente porque espera colher, o agricultor prepara o terreno, lança a semente e, na medida em que a planta cresce, fica atento para que não seja danificada por alguma praga ou fenômeno natural, como a geada, o granizo, e as tempestades. A esperança, quando fidedigna, ao contrário do medo e da acomodação, provoca a pessoa a agir e enfrentar os obstáculos que se lhe opõem.
O episódio da ressurreição de Lázaro, Evangelho deste quinto domingo da Quaresma, é um convite a todos nós para que saíamos dos túmulos do medo e da acomodação e nos capacitemos para gastar a vida no serviço dos irmãos, lutando generosamente contra tudo aquilo que oprime e que rouba do homem a vida plena .
Movidos pela esperança, somos convidados “a eliminar o medo que nos paralisa, que nos fecha em nós mesmos, que não nos permite ver o novo na nossa vida e perceber ali as interpelações de Deus que quer nos libertar da mediocridade de uma vida cristã sem alento”(G. Gutierrez).